terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Constitucionalismos e Constitucionalistas da República

- Chico Ciência?


Documentário - JOSÉ AFONSO DA SILVA - Constitucionalista do Brasil





TESTEMUNHA DA HISTÓRIA
"Todo conservador quer uma Constituição enxuta"
13 de outubro de 2013, 8h17

Por Leonardo Léllis

"Um dos maiores juristas do Brasil." Essa é a definição mais comum de se encontrar em menções a José Afonso da Silva. Seja qual for a filiação teórica, operadores do Direito reverenciam a obra do jurista mineiro de 88 anos, nascido em Pompéu. Não por acaso. Formulador de influente parte da doutrina sobre Direito Constitucional no país, ele testemunhou e atuou no processo que culminou com a promulgação da Constituição em 1988, que comemora um quarto de século.


Ao lado de representantes de diferentes áreas do conhecimento e setores da sociedade, José Afonso da Silva fez parte do time de notáveis na Comissão Afonso Arinos que, entre 1985 e 1986, elaborou o anteprojeto de Constituição. O texto acabou não sendo enviado pelo presidente Sarney à Assembleia Nacional Constituinte, instalada em 1987, mas o trabalho não foi em vão e acabou sendo aproveitado conforme relata. "Ele não tinha como ser ignorado", relembra. Seu trabalho prosseguiu na assembleia, dessa vez como assessor do então senador pelo PMDB Mário Covas. Principal teórico e formulador dos Direitos Sociais garantidos pela Constituição, José Afonso da Silva pode ser considerado um constituinte de fato. 

Tal qual no texto constitucional, não se separa a dimensão política da interpretação teórica que o professor aposentado da Universidade de São Paulo faz do processo Constituinte e de como ele se desdobrou. "O atual sistema eleitoral prejudica a governabilidade", avalia, além de apontar os defeitos do sistema judiciário que perduraram com a Constituição. Apesar dos novos direitos que foram garantidos, o "Poder Judiciário ficou praticamente intacto", diz.

Crítico do conservadorismo, reconhece o caráter progressista que o texto final da Constituição assumiu e está atento às tentativas de se reduzir os direitos sociais que marcam a Constituição. Entretanto, o jurista não se aflige com a falta de regulamentação dos vários dispositivos constitucionais — "não existe democracia acabada" — nem acha que a Carta perdeu sua essência — "os direitos fundamentais constituem um núcleo importante na Constituição. É aí que está a vantagem".

José Afonso da Silva trabalhou em roça de milho, feijão e arroz, foi padeiro, garimpeiro de cristal e alfaiate. Em 1947, mudou-se aos 22 anos para São Paulo, onde concluiu o curso Madureza, uma espécie de supletivo à época. Aos 32, formou-se na Faculdade de Direito da USP, onde foi professor titular e livre-docente em Direito do Estado, Direito Financeiro e Processo Civil. Também foi livre-docente em Direito Constitucional da Universidade Federal de Minas Gerais. No poder público, foi procurador do estado de São Paulo, chefe de gabinete da Secretaria da Justiça do estado, secretário de negócios jurídicos da capital e secretário da Segurança Pública.

Hoje aposentado, já não advoga ou dá parecer. Se dedica a manter sua obra atualizada, da qual se destacam Curso de Direito Constitucional Positivo, que está em sua 36ª edição, e Aplicabilidade das Normas Constitucionais, esta na 8ª edição. Foi em seu escritório, em São Paulo, que José Afonso da Silva recebeu a reportagem da ConJur para dois encontros nos dias 2 e 3 de outubro — no dia 1º, havia sido homenageado pela Ordem dos Advogados do Brasil por sua participação na elaboração do texto constitucional. Na conversa, o jurista relembrou momentos marcantes da Comissão Afonso Arinos e da Constituinte, avaliou o Judiciário brasileiro e fez um balanço desses 25 anos.
Leia os principais trechos da entrevista aqui 



Debates Brasilianas.org - Entrevista com José Afonso da Silva (TV Brasil) 19.01.2015











3:55

Eu me lembro que meu pai em 1933, eu sou eu não vou dizer aqui a idade ne? Porque se não eu teria que dizer:

Não me perguntem quantos anos tenho, e, sim,
quantas cartas mandei ou recebi.
Se mais velho, se mais jovem... o que importa,
Se ainda sou um fervilhar de sonhos,
E não carrego o fado da esperança morta...

Ne?

Que é uns versos dum poeta lá de Conservatória, do Rio.

Aí eu, meu pai em 33... ele saiu. Foi a Pitangui. A região pertencia a Pitangui. Era do município de Pitangui. Ele foi a Pitangui. É claro que naquela época eu não sabia pra quê. Depois eu sei que ele foi votar na Constituinte de 1933 – Olha!

Aquela região era dominada pelo Francisco Campos. O Francisco Campos era dali – O Chico Ciência? – O Chico Ciência!

Era dominada pelo Chico Ciência, enfim.

E me trouxe três livros... 


Gazeta do Racionalismo Cristão

Poesia
Contribuição de Lindalva Almeida
Poema de Moacyr José Sacramento


A serenata é o grande diferencial de Conservatória - RJ



Não me perguntem quantos anos tenho, e, sim,
quantas cartas mandei e recebi.
Se mais jovem, se mais velho...o que importa,
se ainda sou um fervilhar de sonhos,
se não carrego o fardo da esperança morta...

Não me perguntem quantos anos tenho, e sim,
quantos beijos troquei - beijos de amor!
Se a juventude em mim ainda é festa,
se aproveito de tudo a cada instante,
e se bebo da taça gota a gota...
Ora! Então pouco se me dá quanta gota resta!

Não me perguntem quantos anos tenho, mas...
queiram saber de mim se criei filhos,
queiram saber de mim que obras fiz,
queiram saber de mim que amigos tenho,
e se alguém pude eu tornar feliz.

Não me perguntem quantos anos tenho, mas...
queiram saber de mim que livros li,
queiram saber de mim por onde andei,
queiram saber de mim quantas histórias,
quantos versos ouvi, quantos cantei.

E assim, somente assim, todos vocês,
por mais brancos que estejam meus cabelos,
por mais rugas que vejam em meu rosto,
terão vontade de chamar "O Moço!"

E, ao me verem passar aqui...alí...
não saberão ao certo a minha idade,
mas saberão, por certo, que eu vivi!


Moacyr José Sacramento
Poeta brasileiro
Publicado na Gazeta em 4 de março de 2002






Publicado por Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (extraído pelo JusBrasil) - 7 anos atrás

Chico Ciência foi o apelido dado ao advogado mineiro Francisco Luis da Silva Campos devido a sua exuberante capacidade intelectual. Durante o governo de Getúlio Vargas, Francisco Campos foi Ministro da Saúde, da Educação e da Justiça. Foi também o responsável pela redação de alguns dos mais importantes diplomas legais da história brasileira, tais como a Constituição de 1937 (Polaca), o Código Penal (1941), Código de Processo Penal (1941), Consolidação das Leis do Trabalho(1943) e posteriormente o Ato Institucional nº 2 (1964).
Fonte: SAVI
Amplie seu estudo
Tópicos de legislação citada no texto





Doutor Chiquinho


Constituição do Estado Novo traduzia idéias antiliberais de um único jurista: Francisco Campos
Paulo Sérgio da Silva
23/4/2008

A instauração do Estado Novo, em 1937, representou uma profunda transformação para as instituições nacionais e as relações de poder que se mantinham praticamente inalteradas desde a proclamação da República, em 1889. O regime de exceção capitaneado por Getulio Vargas (1882-1954) se prolongaria por oito anos. Ao longo desse período, sob o argumento das armas e da propaganda, a sociedade brasileira foi varrida por um vendaval de profundas mudanças. Se a idéia era conciliar uma aparência de democracia com ações políticas que evidentemente a contrariavam, a solução jurídica para tornar viável o projeto de Getulio era o estabelecimento de preceitos legais que sustentassem conceitualmente essas contradições. Um novo texto constitucional, feito sob medida para esses novos tempos, foi outorgado à nação.

Ao contrário das anteriores (a de 1891 e a de 1934), a Carta de 1937 não seguiu a metodologia republicana clássica – ou seja, um anteprojeto elaborado por alguma comissão e posteriormente aprovado pelo Congresso. Foi obra individual do jurista Francisco Campos, o qual, por sua façanha, receberia o apelido de “Chico Ciência”.
Francisco Luís da Silva Campos nasceu em 1891 em Dores do Indaiá, Minas Gerais. Graduou-se em Direito pela Faculdade Livre de Direito de Belo Horizonte (1914) e entrou para a vida política em 1919, quando foi eleito deputado estadual pelo Partido Republicano Mineiro (PRM). A partir daí, trilhou uma carreira ascendente, tendo ocupado cargos importantes no governo de Minas. Em 1930, participou das articulações que levaram ao movimento armado que conduziu Getulio Vargas ao poder. Depois de chefiar o recém-criado Ministério da Educação e Saúde, foi nomeado por Getulio consultor geral da República e, mais tarde, secretário de Educação do Distrito Federal.

Conhecido partidário de convicções antiliberais, Francisco Campos tornou-se um dos elementos centrais nos preparativos da implantação do Estado Novo. Às vésperas do golpe de 10 de novembro de 1937, Vargas fez dele seu ministro da Justiça, encarregando-o de elaborar uma nova Constituição. O jurista entendia que a instabilidade social se instaurara no país. A revolta comunista de 1935 reforçava seu ponto de vista. Para ele, o liberalismo democrático, centrado na crença da liberdade de expressão e de pensamento, entrara em franca decadência, como evidencia a coletânea de textos de sua autoria publicada na obra O Estado Nacional (1940) e que expressa bem tal convicção.

Confirma-se, assim, o pressuposto de que as regras jurídicas, como todas as criações humanas, refletem a sua época e o pensamento de seus autores. No caso da Carta de 1937, fica evidente a estreita relação entre o texto constitucional e a orientação antiliberal de Francisco Campos. Obra e criador formam aí um binômio complexo e indissociável, no qual o entendimento de uma remete, necessariamente, à compreensão da mentalidade do outro.
Paulo Sérgio da Silva é pesquisador do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança da Universidade Estadual Paulista (GEDES-UNESP) e autor de A Constituição brasileira de 10 de novembro de 1937: um retrato com luz e sombra. (Ed. UNESP, 2008 – no prelo).

Saiba Mais - Bibliografia:
CAMPOS, Francisco. O Estado Nacional: sua estrutura, seu conteúdo ideológico. Rio de Janeiro: José Olympio, 1940.
BRASIL. Constituição brasileira de 10 de novembro de 1937. Brasília: Senado Federal, 1999.
SCHWARTZMAN, Simon. (org.) Estado Novo: um auto-retrato (Arquivo Gustavo Capanema).  Brasília: UnB, 1983.

Um apólogo - Machado de Assis




Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:
— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo?
— Deixe-me, senhora.
— Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável? Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça.
— Que cabeça, senhora?  A senhora não é alfinete, é agulha.  Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.
— Mas você é orgulhosa.
— Decerto que sou.
— Mas por quê?
— É boa!  Porque coso.  Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu?
— Você?  Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu e muito eu?
— Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados...
— Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás obedecendo ao que eu faço e mando...
— Também os batedores vão adiante do imperador.
— Você é imperador?
— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto...
Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser.  Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana — para dar a isto uma cor poética. E dizia a agulha:
— Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco?  Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima...
A linha não respondia; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais que o plic-plic-plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura, para o dia seguinte. Continuou ainda nessa e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile.
Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava de um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha para mofar da agulha, perguntou-lhe:
— Ora, agora, diga-me, quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas?  Vamos, diga lá.
Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha: 
— Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico. 
Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça:
— Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!

Texto extraído do livro "Para Gostar de Ler - Volume 9 - Contos", Editora Ática - São Paulo, 1984, pág. 59.
Conheça o autor e sua obra visitando "Biografias".


"Ironia e Piedade": coletânea de crônicas escrita por Olavo Bilac e publicada em 1916


IRONIA E PIEDADE
OBRAS DO MESMO AUTOR
Poesias—1 volume in 16 de 277 pags. br. 3$, ene.
em perc. 4$, ene. marroquim 5$000
Poesias Infantis— 1 volume illustrado cartonado. . . 3$000
Critica e Fantasia — 1 volume brochado 3$, ene. . 4$000
Conferências literárias— 1 volume in 16 de 381 pags.
br. 3$, ene 4$00
EM COLLABORAÇÃO
tontos palrios^— 1 volume cart 3$000
Livro de Leitura — 1 volume cart 4$00
Livro de Composição — 1 volume cart , 4$000
Theairo Infantil — 1 volume cart 2$00
A Pátria Brazileira — 1 volume cart 3$000
Tratado de. Versificação — 1 volume cart 3$000
Atravez do Brazil — 1 volume cart 3$00

OLAVO BILAC
LIVRARIA FRANCISCO ALVES
166, RUA DO OUVIDOR, 166 — Rio de Janeiro
S. PAULO , BELLO HORIZONTE
129, Rua Libero Badaró ' 1055, Rua da Bahia
1916

A' memória de
Ferreira de Araújo
é dedicado este livro.

Quasi todas estas paginas foram publicadas na
Gazela de Noticias do Rio de Janeiro. Dedico-as hoje,
em volume, á memória de Ferreira de Araújo, meu
mestre e meu amigo.
Escrevendo este nome, revivo muitos annos da
minha mocidade. Este nome e estas velhas laudas
vêm lembrar-me o tempo em que, desconhecido e
feliz, com o cérebro e o coragão cheios de esperangas
e de versos, eu parava muitas vezes, naquella feia
esquina da travessa do Ouvidor, e quedava a namo
rar, com olhos gulosos, as duas portas estreitas da
velha Gazeta, que, para a minha ambigão literária,
eram as duas portas de ouro da fama e da gloria.
Nunca houve dama. fidalga e bella, que mais inacces-
sivel parecesse ao amor de um pobre namorado : —
escrever na Gazela; ser collaborador da Gazeta;
ser da casa, estar ao lado da gente illustre que lhe
dava brilho, — que sonho !
A Gazela era para mim um acropelio fulgido,
coroado de estrellas, perdido entre nuvens : o meu
desejo, tonto e ancioso, andava em torno d'ella, como
um lobo esfomeado em torno de uma presa cubigada.
Felizmente, a minha mocidade não me permittia
mortificagões prolongadas : depois de um namoro de
uma hora, lá me ia eu, rua abaixo ou rua acima, so
nhando e rimando. Tudo então me parecia digno de
rimas : o sol que esplendia, a chuva que toldava o
— 8 —
ceu, o olhar de uma mulher que passava, o bater dos
seus pés na calgada, uma criança que sorria, um ve
lho que manquejava, as flores nas cestas das floris-
tas ambulantes, as fachadas das casas, as jóias que
ardiam nos mostradores dos ourives, e até a tristeza
dos aleijados que pediam esmola. Tudo para mim
era o ponto de partida de um sonho. Os meus passos
moviam-se dentro de uma nuvem perfumada. Nem
sempre os meus sapatos tinham as solas perfeitas,
nem sempre as minhas calças tinham a barra sem
fiapos... Mas o meu andar era soberano e firme,
como o de um deus orgulhoso perdido na terra. Os
meus dezoito annos eram uma riqueza tão grande, que
a riqueza dos outros não me podia causar inveja.
Não era, pois, o desejo de ganhar dinheiro que
me impellia para a Gazeta ; ella não era uma rica
matrona, arreada de jóias e doria de muitas apóli
ces, aureolada pelo fulgor de um grosso dote capaz
•de lhe disfarçar a hediondez da decrepitude : — era
uma linda rapariga, amada e querida de todos, ale
gre como um canário, fresca como uma madrugada ;
e eram a sua belleza, a sua alegria, a sua frescura que
me apaixonavam. Como eu invejava os felizes que
viviam com ella ! Os da casa, os que a dirigiam e ser
viam, — esses já me não causavam tanta inveja.
Mas os cortejadores Íntimos, os convidados freqüen
tes, os collaboradores regulares, — que invejáveis !
como eu syllabava os seus nomes com admiração e
ciúme ! Eram Eça de Queiroz, Machado de Assis,
Ramalho Ortigão, Alberto de Oliveira, tantos ou
tros ... Quando as minhas mãos abriam a Gazeta,
e os meus olhos liam o nome de algum d'esses mes
tres, assignando um conto, uma chronica, um so
neto, — eu imaginava tocar um idolo, numa ara de
ouro puro, incensado pela admiração e pelo applauso
de um milhão de homens.
— 9 —
E' que a Gazeta d'aquelle tempo, a Gazeta de
Ferreira de Araújo, era a consagradora por excel-
lencia. Não era eu o único mancebo ambicioso que a
namorava : todos os da minha geração tinham a
alma inflammada d'aquella mesma anciã. Não era
dinheiro o que queríamos : queríamos consagração,
queríamos nome e fama, queríamos ver os nossos
nomes ao lado d'aquelles nomes celebres. Nós todos
julgávamos, então, que a publicidade era um gozo
e que a celebridade era uma bemaventurança...
Onde se vão esses sonhos ? onde se vae essa crença
na gloria literária ? onde se vae essa fé no trabalho ?
Hoje, não ha jornal que não esteja aberto á
actividade dos moços. O talento já não fica á porta,
de chapéu na mão, triste e encolhido, vexado e far-
rapão, como o mendigo tímido que nem sabe como
ha de pedir a esmola. A minha geração, se não teve
outro mérito, teve este, que não foi pequeno : des
bravou o caminho, fez da imprensa literária uma pro
fissão remunerada, impoz o trabalho. Antes de nós,
Alencar, Macedo, e todos os que traziam a literatura
para o jornalismo, eram apenas tolerados : só o com-
mercio e a política tinham consideração e virtude.
Quando eu tinha 18 ou 19 annos, a Gazeta era
o único jornal que acolhia e prezava a literatura. Por
isso mesmo, os pretendentes formavam cauda á
porta da dama gentil.
Nunca esquecerei, em cem annos que viva, a
manhã do anno de 1884, em que vi um dos meus
primeiros sonetos na primeira pagina da Gazeta.
Doce e clara manhã ! — talvez fosse, realmente,
uma agreste manhã, feia e chuvosa ; mas a minha
alegria, o meu orgulho de rimador novato, a minha
vaidade de poeta impresso eram capazes de accender
um sol de verão na mais nevoenta alvorada de in
verno. ..

Sânzio de Azevedo

 
Ao estrear em livro com as Poesias (1888), quando o Parnasianismo estava completamente definido no Brasil, Olavo Bilac (l865-1918) logo conheceu a glória literária. Com pouco tempo, não havia quem não soubesse de cor os versos de "Ouvir Estrelas... título primitivo do soneto que, no livro, é o nº XIII da "Via-Láctea":
"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo

Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,

Que, para ouvi-las, muita vez desperto

E abro as janelas, pálido de espanto ...
Interessante é que ele seria paradoxalmente, em seu grupo, o que mais próximo chegou do rigor da corrente, com sua forma impecável, sem as aféreses e síncopes herdadas ao versejar romântico, e um dos que dela mais se afastaram, pelo sensualismo escaldante e pelo tom crepuscular de seus últimos versos.

Ao longo dos tempos, tem sido o poeta louvado e atacado, mas Otto Maria Carpeaux observou que "são raras as críticas desfaroráveis nas quais não se assinalassem qualidades ao lado dos defeitos". Assim, em nossos dias, se Wilson Martins vê em Bilac "a espontaneidade da inspiração e o extraordinário rigor técnico" para Massaud Moisés ele "gerou poemas estruturalmente corretos, mas frios". Entretanto, ao falar dos aplausos que o poeta recebeu em vida e dos ataques que seriam desfechados pelos modernistas, o mesmo Massaud Moisés conclui: "um poeta menos denso ou brilhante não suscitaria tais aplausos ou iras apaixonadas".








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